UEFA planeja virada de mesa na Liga das Nações
Bem à brasileira, rebaixamento da Alemanha pode não valer por reformulação do torneio.

Recentemente instaurada e com uma primeira edição razoavelmente bem-sucedida, a Liga das Nações europeia já se prepara para o round dois. Soa estranho, mas é só questão de costume: a partir de agora, o ciclo no Velho Mundo é o mesmo tanto para a Eurocopa, quanto para a Copa do Mundo. Liga, eliminatórias, repescagem, competição principal; repete. O título de Portugal, em junho, foi bastante comemorado, mas não houve tempo para a ressaca, já que a qualificação para o torneio continental estava a todo vapor. Com exceção da distância entre cada rodada de jogos, devido às datas FIFA, o calendário europeu de seleções, atualmente, se assemelha cada vez mais à lógica de clubes. Pouquíssimos amistosos e várias competições ao mesmo tempo, com o campeão de ontem sendo o rebaixado de amanhã. Esta, aliás, foi a principal das novidades trazidas pela Liga das Nações: a queda e o acesso.
Se antes uma seleção apenas se classificava ou ficava fora das principais competições, para que todas se reencontrassem e tentassem de novo em quatro anos, agora há um movimento diferente, uma consequência direta e até mais dura para sequências particularmente ruins. Isso sem falar nas rivalidades, na "contagem" de rebaixamentos e de acessos, na famosa lista de quem "nunca caiu", na possibilidade de seleções como Geórgia e Macedônia comemorarem conquistas... O futebol de seleções segue empolgando muito menos que o de clubes, exceção feita à Copa do Mundo, mas se ele precisava de um resgate, a Liga das Nações parece ter oferecido uma boa alternativa. Porém, ao importar certas ideias, muitas vezes os pontos fracos vêm ao lado dos pontos fortes. Quase grudada ao rebaixamento, por exemplo, está a virada de mesa; justamente o que a UEFA está cogitando para a edição 2020/21 da competição.

O maior sucesso da Liga das Nações, claro, esteve nos playoffs decisivos, entre os quatro campeões de grupo da Série A. Holanda, Suíça, Portugal e Inglaterra se encontraram para decidir o título, enquanto todas as outras seleções viravam a página, independente de seus resultados. Equipes de relevância caíram para a Série C, como Turquia e Irlanda, outras subiram para a Série B, como Sérvia e Noruega. Mas a principal consequência da primeira edição, além do título português, foi o rebaixamento da Alemanha para a Segundona, após campanha pífia sem vitórias no grupo de França e Holanda. Agora, após retirar de seu site a confirmação das divisões para o próximo torneio, a alta cúpula da UEFA se reúne nesta terça-feira (24), com o plano de expandir a divisão principal da Liga das Nações, efetivamente cancelando as quedas de Alemanha, Islândia, Polônia e Croácia. Proposta que fere o regulamento do torneio.
A medida ainda não foi aprovada, no entanto, o simples fato de estar em discussão mostra velha lógica perversa. Para haver qualquer mudança em um sistema de pirâmide no futebol, é preciso uma (ou mais) temporadas de transição, modus operandi que é simplesmente ignorado no momento em que uma proposição deste tipo ocorre. Em tese, a busca de ampliação da Elite da Liga das Nações é sintoma justamente de que ela deu certo. A ideia dos grupos de três era permitir aos principais times um respiro para marcar amistosos, potencialmente com alto retorno financeiro. Entretanto, o que se revelou positivo, inclusive financeiramente, foi a própria competição. Uma Série A com 16 seleções ao invés de 12 seria, portanto, ainda mais atraente e praticamente eliminaria o já diminuto espaço de amistosos. A ideia faz todo o sentido para o futuro, mas respeitando o que foi definido em campo. Mudar isso é virar a mesa.
Justificar a reformulação da Liga das Nações por conta do novo momento do ciclo, antes da Copa e do Mundo e não antes da Eurocopa, será no mínimo assumir falta de planejamento, uma vez que o cenário é o mesmo de quando o torneio foi anunciado. A busca por renda e audiência faz sentido para eventual ampliação da Série A, com mais jogos entre grandes seleções e a manutenção da Alemanha.
Além disso, eventual mudança na Primeira Divisão certamente afetará a pirâmide inteira, uma vez que, para não deixar as séries inferiores desfalcadas, mais descensos teriam que ser cancelados, sob risco das Séries B ou C ficarem com menos de dez equipes. Este problema, entretanto, é pouco relevante para a UEFA, que já começa a tratar de forma diferente as duas Ligas das Nações que existem dentro de um mesmo ciclo. A que precede a Eurocopa, do ponto de vista da cúpula do futebol no continente, é bem diferente da que precede a Copa do Mundo, em termos de preparação para que a dominância se mantenha: são quatro títulos mundiais seguidos, incluindo três finais e duas semifinais 100% europeias. Chegou a ser cogitada a possibilidade de alguma equipe querer ser rebaixada, para jogar contra equipes inferiores e ter maiores chances de um playoff futuro por uma vaga. Já vai ficando claro que não.
O plano ambicioso da UEFA no qual se encaixa a Liga das Nações envolve um fortalecimento ainda maior das seleções europeias. O fato da competição também fazer parte do ranking de eliminatórias e, posteriormente, ter um papel nas repescagens, parece ser uma forma de fortalecer o torneio e dar um ritmo mais conectado ao calendário, não para oferecer um escape à equipes malsucedidas. Só que a mensagem passada por uma eventual reestruturação "para salvar a Alemanha" é exatamente o oposto disso. A preparação para a Copa tem menos amistosos também porque outras Confederações têm eliminatórias mais longas, que já começam em 2020, algo que a UEFA sempre soube. A reunião desta terça, na Eslovênia, decide o futuro da Liga das Nações, das eliminatórias para a Copa e mais. Se a ideia de uma "Alemanha rebaixada" não fazia sentido até recentemente, agora já está próxima a cobrança clássica: "pague a Série B".
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